História e Património - Concelho de Peniche
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Cerâmica tardo-medievais recolhida no âmbito da obra de alargamento do Porto de Pesca
O concelho de Peniche e faixa marítima adjacente tem sido palco, particularmente na última década, de inúmeros projectos de investigação no campo da Arqueologia, trabalhos através dos quais se tem lentamente reconstituído a longa História deste território e das suas gentes.
A Arqueologia dá-nos hoje a conhecer o retrato de um território que à época romana assumia uma posição de charneira no contexto de uma navegação comercial inter-regional, acolhendo nos seus fundeadouros e eventuais estruturas portuárias, embarcações, algumas de grande tonelagem (como parece estar comprovado pela descoberta na Berlenga de dois cepos de âncora em chumbo com cerca de 2,55 e 2,63 m. e 423 e 422 Kg. respectivamente), transportando ânforas envasando produtos como o vinho andaluz, ou as conservas de peixe lusitanas.
A integração deste território nesta rede comercial de longo alcance terá favorecido seguramente a implantação de uma unidade fabril produtora de preparados piscícolas, apoiada por um precoce complexo oleiro situado no Murraçal da Ajuda, produtor essencialmente de ânforas destinadas ao transporte da sua produção conserveira, realidade que perpetua a memória de uma actividade piscatória e industrial que ainda hoje cerca de dois milénio depois continua a pautar a vivência económica e social da gentes de Peniche.
Arqueologia - Concelho de Peniche
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Sítio Arqueológico da Rua Azeredo Perdigão
m 2007, teve início a obra para construção de um empreendimento urbanístico neste local. Os trabalhos de escavação resultantes colocaram à vista um importante conjunto de vestígios arqueológicos da época romana, possivelmente dos séculos I a.C. a III d.C.
No local, foram encontradas várias construções e materiais cerâmicos do período romano. Os trabalhos arqueológicos permitiram perceber que os achados se desenvolviam numa extensão de cerca de 400 m2.
Consulte mais informação na página Sítio Arqueológico da Rua Azeredo Perdigão
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San Pedro de Alcantara
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Escavação arqueológica do depósito funerário
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Vista do sítio onde naufragou o San Pedro de Alcantara
O naufrágio mais célebre da extensa história trágico-marítima da costa de Peniche ocorreu a 2 de Fevereiro de 1786 quando o navio espanhol San Pedro de Alcantara naufragou junto aos rochedos da península da Papoa.
Neste navio, proveniente do Peru e que tinha como destino Cádis, viajavam cerca de quatrocentas pessoas, entre espanhóis, crioulos, índios e prisioneiros incas, envolvidos na revolta, alguns anos antes, encabeçada por célebre chefe índio Tupac Amaru.
O San Pedro de Alcantara transportava uma carga excepcional de mais de 150 toneladas de moedas de ouro e prata, e 600 toneladas de cobre, à qual se deve juntar o peso dos seus 64 canhões, de um lastro de quase 140 toneladas de pedra, de 100 toneladas de quinquina (planta sul americana), de seis toneladas e meia de cacau, e por fim da água e da alimentação necessária para o quotidiano a bordo.
Vergado pelo excessivo peso da sua carga, viria a naufragar na costa de Peniche desencadeando durante os três anos seguintes uma gigantesca operação de salvamento que, permitindo a recuperação de cerca de 90% da carga transportada, abalou a pacatez do quotidiano penichense.
Na sequência do naufrágio do navio espanhol San Pedro de Alcantara no qual viajavam cerca de quatrocentas pessoas, terão perecido neste fatídico acontecimento 128 passageiros, cujos corpos muitas vezes desfeitos pelas rochas e pela força do mar foram apressadamente enterrados, por populares e pelos frades franciscanos do Convento do Bom Jesus (situado nas proximidades) num improvisado depósito funerário localizado no sítio do Porto da Areia Norte.
No âmbito do projecto de investigação do navio San Pedro de Alcantara, desenvolvido por uma equipa de arqueologia liderada por Jean-Yves Blot e Maria Luísa Blot, foi possível identificar o local de 80 dos enterramentos e escavar perto de três dezenas, facto que possibilitou o desenvolvimento de um estudo antropológico definidor do sexo, idade provável à data da morte, tipo antropológico ou patologias de alguns dos náufragos, e na sequência do qual se confirmou a heterogeneidade antropológica dos viajantes do San Pedro de Alcantara.
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Porto de Pesca
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Localização da estrutura em madeira
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Cerâmicas tardo-medievais recolhidas
O acompanhamento arqueológico da obra de alargamento do Porto de Pesca de Peniche, que decorreu entre Maio de 2001 e Outubro de 2002, possibilitou a identificação na área intervencionada, sita em pleno tômbolo da península de Peniche, de vários núcleos arqueológicos de tipologia e cronologia diversa que remetem para a longa diacronia aquática desta área.
No âmbito deste trabalho arqueológico identificaram-se, em antigo contexto aquático, materiais de época romana, nomeadamente ânforas de tipo Dressel 7/11 e Dressel 14, de produção local, vestígios que indiciam a existência de um antigo fundeadouro, capaz de servir a unidade conserveira situada, não muito longe, no Morraçal da Ajuda (Peniche), bem como um importante conjunto cerâmico de cronologia tardo-medieval, cuja relativa repetição das formas recolhidas se coaduna com um contexto de um naufrágio ou acidente marítimo.
Para além das referidas bolsas de materiais, foi igualmente possível identificar, em intervenção arqueológica de emergência decorrida em Abril e Maio de 2002, um troço da antiga estrada de acesso à Praça Militar de Peniche, com cerca de aproximadamente trinta metros de comprimento e sete metros de largura, ao qual se associava uma estrutura em madeira, configurando um passadiço. Este troço de estrada, edificado algures entre o séc. XVI e o XVIII, assentaria sobre uma cofragem de areia, terra e pedras (maioritariamente seixos), aos quais se juntava uma ampla variedade de materiais de índole arqueológica, alvo de reutilização, tais como fragmentos de madeira de fundo naval, objectos metálicos, material cerâmico (cerâmica de construção romana e moderna) e vestígios arqueo-zoológicos vários (moluscos, espécies malacológicas, espécies ictiológicas, suínos e bovídeos), materiais, porventura, disponíveis na área à época da construção.
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Sítio dos Cortiçais
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Etiquetagem
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Utilização de berbequim
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Recolha de ânfora de tipo Haltern 70
A recente identificação na costa Sul de Peniche, na zona dos Cortiçais, de um contexto arqueológico subaquático correspondente a um naufrágio de cronologia romana, parece reforçar o papel estratégico deste antigo território insular no seio de uma rota comercial atlântica.
Sendo presentemente alvo da campanha arqueológica, tendo como finalidade a geo-referenciação e recolha dos achados produzidos, intervenção conduzida pelo Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática e pelo Grupo de Estudos e Pesquisas Subaquáticas, e liderada por Jean-Yves Blot, contando com o apoio da Câmara Municipal de Peniche e do Clube Naval de Peniche, este sítio possibilitou a identificação e recolha de vários fragmentos de ânfora vinária tipo Haltern 70, de produção bética, em tudo semelhantes aos materiais recolhidos no fundeadouro das Berlengas, realidade que acresce uma nova peça a este puzzle a que corresponde a história da presença romana no território a que hoje chamamos Peniche.
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Fundeadouro da Berlenga
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Levantamento de cepo romano
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Ânfora de tipo Haltern 70
Navegado desde da antiguidade o mar de Peniche tem no fundeadouro da ilha Berlenga testemunho desta diacronia histórica. A ilha da Berlenga, pela sua localização estratégica no enfiamento da importante rota marítima ligando o Sul ao Norte da Europa, viu as suas águas fundeadas por embarcações de várias épocas. A memória destas navegações é perpetuada pelos achados subaquáticos recuperados nos últimos anos em diversas missões de investigação, destacando-se destes âncoras em pedra de horizonte fenício-púnico, cepos de âncora em chumbo e ânforas de época romana, ou peças de artilharia, tipo falconete, em bronze, datáveis do séc. XV.
Desta longa diacronia histórica destaca-se com particular relevância o período romano. Com efeito, este território insular parece ter funcionado como ponto de paragem obrigatório para as embarcações comerciais romanas que cruzavam a actual costa portuguesa ligando comercialmente o Mediterrâneo e o Norte da Europa. Este facto parece ser demonstrado pela identificação e recuperação, nestas águas, ao longo das duas últimas décadas, de mais de uma vintena de cepos de âncora em chumbo e de várias ânforas de produção romanas, testemunhos cuja assinalável quantidade atesta a extraordinária importância deste fundeadouro.
As águas do Fundeadouro da Berlenga, têm sido alvo, desde 2001, de uma missão arqueológica que visa a prospecção e geo-referenciação de achados subaquáticos, desenvolvida pelo Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática do Instituto Português de Arqueologia, liderada por Jean-Yves Blot, projecto que conta com o apoio logístico e técnico da Câmara Municipal de Peniche e da RPM Nautical Foundation (Estados Unidos), e com a colaboração do Clube Naval de Peniche e do investigador Dias Diogo.
O estudo dos materiais ânfóricos recolhidos durante esta missão permitiu a identificação de uma forma dominante, a ânfora Haltern 70. Trata-se de uma forma produzida em larga escala entre meados do séc. I a. C. e meados do séc. I d. C., utilizada para o transporte de vinho – um dos principais produtos transaccionados à escala do império romano. A análise das pastas cerâmicas utilizadas permite-nos, dois mil anos depois da sua deposição no fundo do mar da Berlenga, afirmar que estes contentores terão sido fabricados na Bética (Sul de Espanha) tendo transportado vinho produzido na actual Andaluzia, produto que em trânsito destinar-se-ia ao consumo das colónias romanas norte-europeias.
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Fornos Romanos do Morraçal da Ajuda
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Escavação Arqueológica do Forno
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Fragmento de boca de ânfora romana
Através da Arqueologia sabemos hoje que neste território atualmente correspondente ao concelho de Peniche, as populações que ao longo dos tempos o povoaram fizeram da exploração dos recursos marinhos a base da sua economia.
Esta matriz económica de índole piscatória terá sido particularmente notória na época romana, como parece confirmar a presença no Morraçal da Ajuda (Peniche) do que é hoje um dos mais relevantes complexos oleiros de época romana identificados em território português.Em 1998 as obras de construção de um conjunto de campos de ténis em terreno camarário situado no Morraçal da Ajuda, junto à Escola Secundária, puseram a descoberto vestígios de um forno de cerâmica da época romana. As subsequentes escavações arqueológicas desenvolvidas com o apoio da Câmara Municipal de Peniche, por equipa liderada por Guilherme Cardoso e Severino Rodrigues, permitiram identificar a presença de um complexo oleiro composto por quatro fornos, datáveis de período sito entre os finais do séc. I aC e o início do séc. III da nossa era, estruturas de uma olaria que parece ter centrado a sua produção no fabrico de ânforas – os contentores, por excelência, do comércio da antiguidade.
São diversos os trabalhos publicados sobre este interessante projeto. -
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Gruta da Furninha
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Entrada da Gruta da Furninha
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Vaso Globular - Cerâmica Neolítica
A Gruta da Furninha, localizada na costa Sul da península de Peniche, corresponde a uma cavidade natural ocupada durante o período pré-histórico, tratando-se da mais importante estação pré-histórica do concelho.
Hoje localizada junto ao mar, esta gruta foi ocupada entre o Paleolítico Médio e o final do Calcolítico, tendo sido escavada em 1880 pelo estudioso Joaquim Nery Delgado.
Utilizada como abrigo e necrópole, esta estação pré-histórica forneceu um vasto espólio arqueológico, do qual se destacam: vestígios osteológicos de vários hominídeos, nomeadamente do Homo Sapiens (Homem de Neandertal) e de Homo Sapiens Sapiens (Homem actual); vestígios de fauna do período quaternário (peixes e mamíferos); utensílios líticos (bifaces, pontas de seta, machados de pedra polida...); utensílios em osso; e várias peças de cerâmica neolítica (os célebres vasos de suspensão da Gruta da Furninha).
Este numeroso espólio encontra-se disseminado por vários museus entre eles o Museu Municipal de Peniche.
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